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terça-feira, agosto 29, 2006

Uma faca de dois gumes…

O diário desportivo «O Jogo» noticia hoje que a equipa de Sevens de Portugal terá sido abordada no sentido de participar na totalidade das etapas do circuito da IRB de 2006/2007.


Legenda: Diogo Mateus (Créditos: Site da FPR).

Os «Lobos» já disputavam com boa regularidade as etapas do circuito, mas a confirmar-se este convite da IRB, os portugueses realizarão pela primeira vez a competição completa, o que levanta questões importantes, transformando a reflexão em torno desta discussão numa faca de dois gumes… Quero dizer: existem bons argumentos para agarrar o convite com todo o empenho e argumentos igualmente válidos para pensar duas vezes antes de investir mais recursos e tempo numa variante do Rugby que, para a generalidade das grandes nações da modalidade, é meramente secundária.

O seleccionador nacional de XV e Sevens, Tomaz Morais afirma «Temos de aproveitar a oportunidade, seria suicídio se não o fizéssemos» (O Jogo, 29/08/2006, pág.36). Compreendo perfeitamente o seu entusiasmo, bem como a motivação dos jogadores portugueses para participarem em todas as etapas, com outras condições de preparação e, por consequência, com outras possibilidades de obter melhores resultados.

Ninguém mais do que os jogadores e o técnico merecem «brilhar» nos relvados, e o circuito de Sevens da IRB poderá ser o palco ideal para o fazer. Se hoje já lutamos efectuamos bons jogos contra equipas como a Argentina, Gales, Escócia e Samoa, no futuro poderemos competir de forma consistentes contra essas mesmas nações. E isso só poderá ser positivo para o Rugby português como um todo e para os jogadores dos «Lobos», no plano equipa/individual.

Creio que atletas como o Diogo Mateus merecem jogar perante multidões. Merecem erguer troféus importantes e sobretudo jogar Rugby de alto nível. Tomaz Morais, que não conheço pessoalmente, também o merece (tenho essa ideia), e é natural que a abordagem da IRB abra enormes expectativas e esperanças nos nossos atletas.

O que não encontro é uma relação directa entre a participação de uma equipa profissional/semi-profissional no circuito de sevens da IRB e uma real evolução na vertente clássica do Rugby, disputado entre equipas de XV elementos. Pelo contrário, a concentração excessiva na vertente de sevens tem tido impacto negativo ao nível das competições nacionais portuguesas e, num contexto mais alargado, no desenvolvimento da modalidade em algumas nações mais poderosas no mundo oval. Os «Sevens» não são, na minha perspectiva, uma boa estratégia de desenvolvimento da modalidade no seu todo quando encarados como uma prioridade nacional.

O XV das Fiji já foi mais temido do que é hoje, e muitos apontam o seu enfraquecimento à aposta total no circuito de Sevens da IRB. É certo que as Fiji não têm, neste momento, equipa à sua altura no circuito, mas o arquipélago vem perdendo competitividade na vertente de XV.

Portugal conta com poucos praticantes e um número muito reduzido de jogadores com qualidade para representar a selecção nacional. Dividir forças entre a equipa de XV e a selecção de «Sevens» (acrescentando-se ainda o Rugby de clubes) poderá ser perigoso, em especial quando falamos de atletas actualmente amadores. O circuito de Sevens é extenuante, envolvendo frequentes deslocações aos mais remotos destinos deste mundo, e não será possível pedir aos atletas mais utilizados que alinhem igualmente na selecção de XV.

Depois há a questão das incompatibilidades entre a utilização de jogadores nas equipas nacionais e a utilização dos mesmos atletas nas competições de clubes. Alguns emblemas poderão ter interesse em manter um elevado número de atletas seus no circuito da IRB, mesmo com prejuízos desportivos imediatos. No caso do Belenenses creio que não. O Belenenses não tem no Rugby a sua modalidade n.º1 (nem única) e precisa de resultados regulares para «justificar» a manutenção da modalidade e da sua excelente escola de jogadores, provavelmente a melhor do país.

Infelizmente, o calendário e o modelo de campeonato para 2006/2007 foi aprovado sem ter em conta esta possibilidade de ter um grupo de jogadores a competir de forma ainda mais regular nas etapas no circuito da IRB. Os clubes acabaram por assinar de cruz um mapa de jogos que poderá vir a ser alterado por via da concretização prática do convite e sua aceitação por parte da FPR.

É uma faca de dois gumes, perigosa seja qual for a perspectiva de abordagem.

Post Scriptum I: De férias no Algarve formulei a uma senhora de uma loja de revista (em Tavira) a pergunta mais estúpida que essa mesma vendedora terá ouvido nos últimos tempos: «Tem revistas de Rugby?». Surpreendida, respondeu: «Não… Isso nem se joga em Portugal, pois não?». Lá lhe expliquei que sim, e em dois ou três minutos a senhora já me dizia: «pois é, como não se vê na televisão a gente não sabe». Parece-me que é nesta questão que reside o verdadeiro «suicídio» do Rugby luso.

5 Comments:

At 2:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

essa noticia não é de agora e este calendario já foi feito com esta noticia na cabeça dos dirigentes, o problema são os clubes que dão muitos jogadores á selecção, vao ser prejudicados... mas duvido que os jogadores não queiram jogar e ficar em portugal, alem disso até está em cima da mesa um ordenado mensal, só para jogar rugby...

 
At 11:40 da manhã, Anonymous Anónimo said...

As fiji sao um caso particular que nao acho que nao pode ser facilmente explicado. A baixa de forma dos fijianos nao se deve a sua aposta no circuito de sevens mas mais devido a professionalizacao do rugby. Quando estive nas Fiji este ano tive a oportunidade de falar com varias pessoas, entre elas ex-internacionais, que me disseram que desde que o dinheiro entrou no rugby fijiano este comecou a cair de qualidade. Os jogadores ja so pensam em ganhar dinheiro, e representar o pais passou para segundo plano. Talvez isto seja uma consequencia da pobreza que existe nas fiji. Outra razao e o facto de a NZ (com maior poder financeiro) retirar alguns dos melhores jogadores a ja pobre seleccao fijiana.
Talvez o exemplo da argentina seja mais parecido com o nosso caso. Campeonato regional e nacional de clubes amador tal como o nosso. Jogadores orgulhosos de vestirem a camisola da selecao, tal como os nossos. Se olhar-mos bem ao recente desenvolvimento do rugby argentino vemos que este coincide com a suas boas projeccoes no circuito IRB sevens (vitorias em LA). Essa projeccao levou a IRB a ajudar mais o desenvolvimento do rugby argentino o que a medio longo prazo estou certo que sera bem retribuido.
Lembrem-se que o IBR sevens e transmitido por mais de 32 canais de televisoa e visto por mais de 475 milhoes de pessoas. Eu se fosse dono de uma empresa nao me importaria de patrocinao uma equipa que tivesse esta projeccao. Talvez os clubes portuguese nao vejam bem qual o beneficio de ter jogadores a jogarem no circuito mundial de sevens, mas isso nao se deve a mais nada a nao ser a uma grave miopia.
Abraco
Miguel

 
At 12:39 da tarde, Blogger Rui Silva said...

Miguel, concordo com grande parte dos seus argumentos, e ainda para mais quando tem conhecimento directo da situação actual do Rugby fijiano. Eu só vejo tudo ao longe, e tento fazer a interpretação mais justa possível da informação que me chega às mãos.

Agora, sobre o recorrente problema das incompatibilidades clubes/selecção, e falando no caso específico do Belenenses (que creio que conhece por dentro), direi que existe uma necessidade constante de resultados, que muitas vezes não é compatível com os interesses da(s) selecção(ões). O Belenenses não é um clube de Rugby, e as suas secções existem para prestar serviço público (formação desportiva aos jovens), mas sobretudo para engrandecer, por via de resultados próprios e vitórias nacionais, o nome do clube.

Saberá que há muita gente que vê com maus olhos esta chata modalidade de homens casmurros que persistem em lutar por um «melão», dando cabo dos relvados e partilhando-os com o futebol...

É isso que me preocupa. A sede de alguns de acabar de vez com o Rugby azul. O Belenenses precisa de continuar a ter resultados, dos iniciados aos seniores! E para isso precisa do camião de jogadores que envia para a selecção!

As remunerações a pagar aos jogadores e as compensações a dar aos clubes (!!!) podem vir a interessar a alguns emblemas, que apesar de tudo não vivem com a pressão constante que acabei de referir. Mas no Belém a coisa não funciona assim, apesar da grande autonomia da sua secção.

 
At 1:04 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Pois o beleneses e que e um caso bicudo. Eu, sou, e sempre fui de acordo com a idea que nos deveriamos cada vez mais ser independentes do belenenses como futebol clube. Para isso e preciso duas coisas, primeiro alguma autonomia financeira e segundo alguma coragem de avancar. Considero que o primeiro nao e assim tao dificil de arranjar. Por exemplo concorrer a fundos camararios, governamentais e da FPR. Esta tudo disponivel e so preciso accao. Ja o segundo me parece mais dificil, isto porque para muitos a sede do rugby ali no estadio e mudar-se de sitio e uma coisa muito complicada para essas cabecas.
Apartir do momento que comecarmos a pensar grande o problema de ceder este ou aquele jogador a seleccao deixa de ser um problema mas sim um orgulho. E com as escolas de rugby que belem teem concerteza que nao e dificil ter profundidade na equipa principal.
Temos que nos deixar de dormir e pensar que o direito teve o campo porque conhecia alguem na camara, que o Tecnico teve o campo porque arranjou um esquema malandro com o metro de lisboa. Desculpas esta o inferno cheio. E preciso actuar, e penso que deveriamos criar uma comissao de trabalho que se encarregasse de arranjar uma solucao autonoma para o futuro. Temos dentro do rugby pessoas importantes com grandes conhecimentos que podem ajudar muito em arranjar esse espaco.

 
At 2:56 da tarde, Blogger Rui Silva said...

Eu creio que a integração do Rugby do Belenenses no todo do clube é positiva! Não me passa pela cabeça evoluir de uma autonomia que é positiva (e que tem sido apontada como um exemplo de sucesso no quadro das várias secções do clube) para uma independência... O Rugby do Belém será sempre no Belenenses!

Agora, que é preciso encontrar soluções para evitar guerras internas, invejas entre secções e tantos comentários negativos sempre que a equipa senior tem o «azar» de não vencer... isso é verdade!

Eu creio que no que diz respeito a terrenos de jogo há duas soluções possíveis:
- Transformação do pelado do Restelo num campo de Rugby;
- Recuperação do antigo campo das Salésias (hoje ao abandono) e sua utilizão por parte do Rugby azul (sendo aqui de considerar eventuais acordos de utilização do campo por parte das equipas nacionais).

A FPR e a CML têm o dever - diria, a obrigação! - de apoiar o Belenenses, que sendo uma grande escola de jogadores não ainda um campo para o Rugby!

Mas repito: rugby autonomo sim! Rugby «independente» jamais!

Abraço,
Rui Vasco

 

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